É certo que muitos filmes dramáticos possuem
seu foco principal, ou seja, a criminalidade, conflitos familiares, homossexualidade...
dentre muitos outros, mas Moonlight é o primeiro longa que assisti (do qual me
recordo) que trata destes e mais diversos assuntos paralelamente em um mesmo entrecho
acerca de uma só personalidade. Sem dúvida alguma, mesmo os que não curtirem a
película, terão o que refletir e serão tocados de alguma forma.
Extremamente aclamado, vitorioso em festivais
recentes e um dos favoritos neste iminente Oscar 2017, Moonlight, ao decorrer
de seu enredo, segue um jovem negro (Chiron, também conhecido como Little e
Black) ao longo de sua vida dividida em três segmentos, infância, juventude e
fase adulta. É obvio que, consoante esta premissa e uma sinopse que abrange
basicamente uma jornada de autoconhecimento e confrontos, o entusiasmo não se
eleve tanto, afinal, quantos não são os filmes que abordam o mesmo contexto? Mas
não se engane, o longa é muito mais do que isso e, como já dito, acaba por ser bem
mais expansivo referente a múltiplos aspectos.
Com uma sequência inicial que já apresenta certas
predominâncias do roteiro, a película principia explorando certa parte do mundo
do tráfico de drogas e o bullying que muitos sofrem desde cedo. Além, induz um
relacionamento significativamente paternal conforme a ausência de um pai
biológico e verdadeiro e o abismo que praticamente existe, apesar de bem
próximos, entre mãe e filho. Este, o considerável vínculo paternal, será fruto
de muitos conflitos, tanto pessoais quanto morais, de interesses e valores, assim
como virá a ser influente na vida do protagonista e o alicerce de outra relação
que irá se solidificar e igualmente terá sua parcela de influência na trajetória
de Chiron. Ratifico que determinados fatores citados (não especificarei quais
para não dar spoilers diretos) sofrerão uma mudança de papéis no futuro de Little. Ademais, não nos esqueçamos que o intérprete da figura simbolicamente
paternal é o responsável por outra indicação ao mais cobiçado prêmio do universo
cinematográfico, desta vez a Melhor Ator Coadjuvante (Mahershala Ali). Vale
ressaltar que este artista se encontra em outra produção de realce e
concorrente ao Oscar de Melhor Filme, Estrelas Além do Tempo.
Dentre as reflexões impostas, talvez a mais
ácida, controversa e incomoda (pelo menos para alguns) seja o homossexualismo e
o preconceito corrente, e não o racismo (o qual nem é mencionado na película) como
muitos devem pensar conforme o arco girar em torno de uma pessoa negra e o longa
focar praticamente apenas em personagens da dita etnia. Prosseguindo, nos vemos
diante de várias situações onde a opção sexual de Black se mostra um empecilho ao
gerar conturbadas e discriminatórias relações com outras pessoas, sendo a
responsável pelo bullying sofrido na infância e adolescência, como também a
responsável por sua personalidade introspectiva, assim como a pioneira de uma amizade
infantil que evolui até se tornar uma paixão. Consoante os conflitos do protagonista,
somos imersos em uma condução que explora o íntimo e o eu interior de Chiron,
além da máscara que utiliza para encobrir sua verdadeira face. Como se observa,
o filme se posiciona, neste quesito, de tal maneira a fazer uma alegoria a todos
nós e os sentimentos que buscamos ocultar perante os outros e as muitas facetas
irreais pelas quais nos mascaramos em nosso cotidiano. Ou seja, buscamos ser o
que não somos para agradar pessoas de quem não gostamos (percebeu a referência?),
temos nossos princípios morais alterados e personalidade transformada perante
situações drásticas e acabamos vivendo sob os critérios de segundos que regem
nosso dia a dia ou simplesmente temos de conviver reclusos conforme o mundo preconceituoso
que nos cerca. Com isto, identificamos na figura de Little toda a complexidade
presente em um ser humano, ademais da representação das várias pessoas que
passam por similares complicações em sua dura e difícil rotina diária.
Ainda referente ao relacionamento homossexual
de Black, este acaba por gerar aqueles famosos momentos constrangedores (pouquíssimos,
diga-se de passagem), além de uma cena de beijo gay que foi proibida na Índia. Apesar
do assunto delicado e passagens que um público comum e mais superficial não
está habituado, em nenhum momento o longa se torna depravado ou escandaloso, ademais
de não fornecer justificativas para o corte da cena de suma relevância no país
asiático.
Utilizando como um dos principais artifícios o
tempo, a película, ao passar por vários períodos da vida de Chiron, se
aprofunda em diversos aspectos que sofrem certas mudanças e outros que permanecem,
podendo ser citado como exemplo prevalecente as características psicológicas do
protagonista mesmo frente à mudança de atores, o que só comprova o quanto estes
desempenharam uma performance extraordinária (embora nenhum deles conseguiu uma
nomeação a Melhor Ator). Com outras belíssimas atuações (Naomi Harris tem
grandes chances na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante) e inúmeras outras reflexões
propostas que vão desde questionamentos sobre a vida, atitudes que tomamos e rumos
que trilhamos, o filme flui naturalmente e está repleto de passagens tocantes e
emocionantes, além de se destacar consoante determinados aspectos que se
sobressaem mais que outros e atribuem ao longa uma pincelada diferenciada, como
a trilha sonora geralmente orquestral que se alterna entre toques de RAP e melodias
mais sentimentais, sequências sem cortes que permitem uma bela, fluida e mais
compreensível condução, cenas de realce em câmera lenta e passagens que são marcadas
pela falta de diálogo que usufruem de outro meio para transmitir a sensação desejada.
Em suma, Moonlight é excepcional e brilhante ao
que se propõe, apesar de não ser um filme que agradará o paladar de todos. Similarmente tem
tudo para ser lembrado ainda por muito tempo e, considerando as 8 indicações deste
Oscar 2017, sair bastante vitorioso da cerimônia mais aclamada do universo
cinematográfico. Além, enfatizo que, embora não seja minha película favorita
dentre os nomeados (também não é La La Land), acredito que a produção seja a vencedora
de uma das mais cobiçadas categorias do festival, a de Melhor Filme.
Matheus
J. S.
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Avaliações:
IMDb: 7,9
Rotten: 98%
Fimow (média geral): 4,2
Adoro Cinema (usuários): 4,0
Kontaminantes (Matheus J. S.):
9,5
Ficha Técnica Resumida (Wikipédia):
Estados Unidos
2016 • cor • 110 min |
|
Direção
|
Barry Jenkins
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Produção
|
Adele Romanski
Dede Gardner Jeremy Kleiner |
Roteiro
|
Barry Jenkins
|
História
|
Tarell Alvin McCraney
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Elenco
|
Trevante Rhodes
André Holland Janelle Monáe Ashton Sanders Jharrel Jerome Naomie Harris Mahershala Ali |
Música
|
Nicholas Britell
|
Cinematografia
|
James Laxton
|
Edição
|
Nat Sanders
Joi McMillon |
Companhia(s) produtora(s)
|
A24
Plan B Entertainment Pastel Productions |
Lançamento
|
EUA
21 de outubro de 2016
|
Idioma
|
Língua inglesa
|
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